Prevenção na palma da mão

19/12/2019 16:56

mSmartAVC®: aplicativo móvel atua na prevenção, diagnóstico e aprendizagem sobre o acidente vascular cerebral

Nicole Trevisol

Em 27 de fevereiro de 2018 Camila Rosalia Antunes Baccin conquistava o título de Doutora em Enfermagem. Diante da banca examinadora, ela apresentava o resultado de uma pesquisa de quatro anos: o mSmart AVC – aplicativo móvel para a aprendizagem da detecção e cuidados de enfermagem a pessoa com acidente vascular cerebral.

Segundo dados da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, o Acidente Vascular Cerebral (AVC) é a segunda causa de mortes entre os brasileiros, uma doença silenciosa provocada quando os vasos que levam sangue ao cérebro entopem ou se rompem. O diagnóstico ágil e o tratamento adequado do AVC dão maiores chances de recuperação completa ao paciente. Por isso, estar atento aos sinais e sintomas é atitude primordial aos indivíduos e aos profissionais de saúde. Foi pensando nessa relação entre prevenção e acompanhamento que Camila uniu sua vivência profissional com a oportunidade de desenvolver, durante o doutorado na UFSC, uma ferramenta tecnológica aberta e gratuita para auxiliar na aprendizagem dos profissionais de saúde no apoio à tomada de decisão durante a avaliação clínica dos pacientes com AVC.

“Ao trabalhar junto a uma equipe voltada ao cuidado com o paciente de AVC, me dei conta da necessidade de qualificar, também, os meus colegas enfermeiros para atuarem em um modelo de atenção. Foi quando decidi focar a minha tese no desenvolvimento de um aplicativo”, revela a doutora. A linha de pesquisa da autora é Tecnologias e Gestão em Educação, Saúde, Enfermagem e está atrelada a uma área chamada de Informática em Saúde. A UFSC é a primeira instituição de ensino pública do Brasil a implantar um Mestrado Profissional em Informática em Saúde que congrega as Ciências da Informação, da Comunicação e da Saúde. “Ao unir essas três áreas, desenvolvemos produtos para melhorar a saúde das pessoas e dar um pouco mais de autonomia aos profissionais de saúde. No caso da Camila, o mSmartAVC® aborda uma das doenças que mais mata no país com o objetivo de identificar rapidamente o AVC por meio de um aplicativo”, diz Dal Sasso.

Usando de inteligência artificial, a ferramenta permite que dois públicos distintos atuem na prevenção, diagnóstico e processo de aprendizagem, reduzindo os índices de mortalidade por AVC. O profissional de enfermagem poderá identificar e atender o paciente de maneira rápida. Já o paciente poderá identificar os seus sintomas e verificar o que pode ser feito. “A ideia é estimular o comprometimento da pessoa em relação a sua saúde, um movimento que está acontecendo naturalmente, uma vez que na atualidade boa parte da população usa a tecnologia via smartphone, o que chamamos de tecnologia persuasiva”, complementa a orientadora, reforçando que o aplicativo compreende tanto a área da educação (profissional) quanto da saúde (usuário).

O desenvolvimento do estudo

A pesquisa de Camila foi divida em três blocos com vistas à construção de um sistema que busca o cuidado mais ágil, seguro e oportuno à saúde: 1) produção tecnológica; 2) avaliação da aprendizagem pré-teste e pós-teste do aplicativo mSmartAVC®; e 3) avaliação da qualidade do mSmartAVC®.

Segundo a autora, os manuscritos produzidos na tese contemplam a produção tecnológica, ou seja, a descrição de todo o processo de desenvolvimento do aplicativo. “Na etapa dois é possível verificar os resultados da aprendizagem antes e depois do uso do aplicativo, como também a descrição da concepção pedagógica utilizada (aprendizagem baseada em problema). A terceira e última etapa avaliou a qualidade do aplicativo por meio do instrumento LORI®, que conferiu um conceito ‘muito bom’ ao mSmartAVC®”, explica Camila.

Participaram da pesquisa 150 pessoas, sendo 115 enfermeiros dos serviços de urgência e emergência e 35 acadêmicos de enfermagem que utilizaram o aplicativo em um estudo quase-experimental, do tipo antes e depois (primeiro testa-se o aplicativo e depois mede-se o nível de aprendizagem; as duas etapas envolvem enfermeiros e estudantes). O resultado da tese mostrou que a ferramenta digital é um potencial espaço para aprendizagem e apoio na tomada de decisão de enfermeiros e acadêmicos de enfermagem do último ano da graduação.

“Usamos cenários realísticos simulados e intuitivos a partir de dois casos clínicos de AVCs: AVC hemorrágico e AVC isquêmico. Por esse motivo, tornou-se uma ferramenta de
aprendizagem fácil”, salienta a pesquisadora. Para Camila, a tecnologia de apoio ao diagnóstico e intervenção de enfermagem favorece o ensino e a tomada de decisão à beira do leito, ou seja, qualifica o cuidado de enfermagem aos pacientes de AVC como também os familiares, que atuam como cuidadores.

“Para mim, a produção de conhecimento precisa contribuir para o bem comum, esse deve ser o primeiro objetivo da ciência. O meu desejo sempre foi além do diploma, busquei desenvolver e implantar uma proposta dentro da linha de cuidados do AVC. Serviços foram estruturados e equipes foram sensibilizadas em torno dessa temática. Esse foi, sem dúvida, o melhor resultado que alcancei em benefício daqueles que mais sofrem”. Grace Dal Sasso sente-se feliz com a conquista de Camila Baccin e realizada, pois é a sua segunda vez no Prêmio Capes de Tese como orientadora. “É gratificante ver que outros profissionais estão seguindo a minha trajetória na pesquisa de processos educacionais em saúde atrelados à tecnologia. O que queremos é desenvolver produtos que tenham impacto social construído a partir de um método científico rigoroso. Temos aqui um exemplo da ciência aplicada na sociedade de maneira gratuita. Não consigo me ver na academia produzindo algo que fique na prateleira, as pessoas têm que usar, assim a ciência faz sentido. Me sinto orgulhosa em fazer parte desse time”, frisa ela.

Atualmente, o mSmartAVC® está em processo de registro de patente, tradução para o inglês e o espanhol e, em breve, estará disponível para dispositivos móveis por meio dos sistemas operacionais Android e iOS. Na UFSC, o Laboratório de Produção Tecnológica em Saúde e Enfermagem e o Grupo de Pesquisa Clínica, Tecnologias e Informática em Saúde e Enfermagem (Lapetec/Giate) estão estruturando uma página on-line que comporte os sistemas desenvolvidos pelos trabalhos vinculados ao programa de Pós-Graduação em Enfermagem e ao Mestrado Profissional em Informática em Saúde, que estarão disponíveis de maneira gratuita aos profissionais de saúde e à população.

Prêmio Capes de Tese 2019

A pesquisa de Camila Baccin foi uma das contempladas no Prêmio Capes de Tese, edição 2019, na área de Enfermagem, e foi avaliada pelo Colégio de Ciências da Vida, Grande Área Ciências da Saúde.

A orientação foi de Grace Teresinha Marcon Dal Sasso, docente no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Quatro doutores da UFSC foram vencedores do Prêmio Capes de Tese 2019, que seleciona anualmente a melhor tese para cada uma das 49 áreas do conhecimento reconhecidas no país. Outros quatro trabalhos da UFSC receberam Menções Honrosas.