Missão espacial
Equipe da UFSC desenvolve satélite que será lançado em 2016
Daniela Caniçali
Um cubo com 10 cm de aresta, pesando aproximadamente um quilo, constituído de computador de bordo, painéis solares, bateria e carga útil (dispositivos que exercem funções preestabelecidas, como fotografar, medir a temperatura etc.). Essas são as características do nanossatélite do tipo cubesat que está sendo desenvolvido desde 2012 no projeto Floripa Sat, uma iniciativa de pesquisadores e alunos de diferentes cursos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A previsão de lançamento é dezembro de 2016.
O Floripa Sat surgiu de forma independente, inspirado em outros projetos experimentais do Centro Tecnológico (CTC) — como o BAJA SAE, do curso de Engenharia Mecânica, que se destina a produzir protótipos de veículos automotivos off-road. “Existe aqui na UFSC o BAJA; o barco elétrico; o carro elétrico. São vários projetos. Pensamos então em propor o desenvolvimento de um satélite para que os alunos se interessassem e se motivassem também pela área aeroespacial”, explica o professor Eduardo Bezerra, do Departamento de Engenharia Elétrica e um dos coordenadores do projeto. Outro coordenador, professor Kleber Vieira de Paiva, do curso de Engenharia Aeroespacial (Campus Joinville), reforça que o principal objetivo do projeto é educativo: “O aluno tem a oportunidade de participar de uma missão espacial completa”. Ao mesmo tempo em que passou a contribuir para a formação dos estudantes, o Floripa Sat também deu visibilidade à área aeroespacial, ainda recente nas universidades brasileiras. O curso da UFSC foi criado em 2009 e é uma das únicas seis graduações em Engenharia Aeroespacial em todo o país.
Até chegar a sua “versão final” e ser lançado, o satélite passa pelas seguintes etapas: análise de requisitos; projeto; desenvolvimento; integração e testes. Na etapa de levantamento de requisitos, são definidas desde as faixas de temperatura que o satélite deve aguentar, a velocidade de comunicação com a Terra, até as funções que irá executar. Na etapa de projeto, são desenvolvidas as placas — com microprocessadores que mantêm o satélite em funcionamento —, um dos diferenciais do Floripa Sat.
Enquanto outras universidades utilizam placas prontas, na UFSC elas estão sendo desenvolvidas pelos próprios alunos. “Nós adquirimos uma placa da empresa que fabrica um dos melhores modelos de cubesat. Mas essa placa vai servir apenas como modelo de referência. Nosso interesse é o desenvolvimento científico: poder estudar os circuitos e, talvez, até desenvolver placas mais eficientes”, explica Eduardo.
Na etapa de integração, os diversos subsistemas do cubesat são colocados para funcionar em conjunto, passando-se então à fase de testes, quando o satélite como um todo é submetido a um ambiente de voo. Após ser aprovado nos testes, chega então o momento mais esperado: a integração ao veículo lançador, e o lançamento do satélite. “A sensação de colocar um satélite em órbita é de muita satisfação, de dever cumprido. É algo que deve ser planejado com cuidado, pois, se qualquer coisa der errado, o objetivo final, que é estabelecer a comunicação do satélite com a Terra, pode não ser atingido”, explica Kleber. O doutorando Leonardo Slongo, pesquisador do projeto, também descreve essa etapa como a que gera mais expectativa. “São realizados vários testes, mas, ainda assim, existe muita apreensão, sobretudo nos primeiros minutos do lançamento.” Kleber acrescenta: “Você não tem uma segunda chance”.
Se a missão for bem-sucedida, chega a fase de monitorar as atividades do satélite, coletar dados e, com essas informações, divulgar os resultados do trabalho por intermédio de publicações e patentes. “O trabalho não acaba no lançamento, ele continua. Enquanto estiver em órbita, os alunos vão estar envolvidos na comunicação com o satélite”, explica Kleber. O Floripa Sat será transportado como carga de um satélite de maior porte, o Unisat- 7 (da empresa G.A.U.S.S.), que, por sua vez, será acoplado ao foguete Dnepr, com data de lançamento prevista para dezembro de 2016, na Rússia. A integração final será realizada na Itália, com o acompanhamento de dois membros da equipe da UFSC, prioritariamente estudantes.
CubesatO cubesat — abreviação das palavras em inglês “cube” (cubo) e “sat” (satélite) — caracteriza-se por sua estrutura simplificada e custo reduzido: enquanto para o seu lançamento são gastos aproximadamente 100 mil dólares, para o de um satélite convencional os custos chegam a 250 milhões. Os satélites de pequeno porte, conhecidos como nanossatélites, também se distinguem pelo alto valor agregado. “Os componentes que precisamos adquirir para desenvolver uma placa custam cerca de 100 dólares. Quando fi ca pronta, ela pode ser vendida por 15 mil dólares”, afirma o professor Eduardo. O padrão cubesat foi desenvolvido em 1999, no contexto da tendência dos nanossatélites, com o intuito de fomentar a pesquisa universitária na área de Engenharia Aeroespacial. Seus idealizadores, Jordi Puig-Suari e Bob Twiggs, professores das universidades norte-americanas California Polytechnic State University e Stanford University, tinham o propósito de proporcionar aos estudantes de graduação e pós-graduação a possibilidade de projetar, construir, testar e operar um satélite semelhante ao Sputnik. Os dois pesquisadores estarão em Florianópolis, no primeiro semestre de 2016, para o evento “II Latin America IAA CubeSat Workshop”, organizado pela equipe do projeto Floripa Sat. |
Projeto Serpens
Outro projeto que tem a participação da UFSC, em parceria com outras universidades, é o Sistema Espacial para a Realização de Pesquisas e Experimentos com Nanossatélites (Serpens). Coordenado pela Agência Espacial Brasileira (AEB) como uma atividade do programa Uniespaço, o Serpens foi criado em dezembro de 2013, com o objetivo de qualificar a pesquisa acadêmica na área. Ao longo dos anos, estudantes dos cursos de Engenharia Aeroespacial do país terão a oportunidade de aplicar a teoria na prática, participando do desenvolvimento e lançamento de cubesats. O primeiro, o Serpens I, foi lançado em agosto de 2015, rumo à Estação Espacial Internacional (ISS), e colocado em órbita no dia 17 de setembro. Além da UFSC, quatro instituições brasileiras participam do projeto Serpens: Universidade de Brasília (UnB); Universidade Federal do ABC (UFABC); Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Instituto Federal Fluminense (IFF). Em cada missão, uma equipe fi ca responsável por liderar o projeto: o Serpens I foi liderado pela UnB; o Serpens II — que já está em desenvolvimento, com previsão de lançamento para dezembro de 2017 — está sendo coordenado pela equipe da UFSC.
Equipe
Atualmente, integram o Floripa Sat dez professores e trinta alunos da graduação e pós-graduação em Engenharia Aeroespacial, Engenharia Elétrica, Engenharia Eletrônica, Engenharia Mecânica, Ciência da Computação e Engenharia de Controle e Automação. Além do projeto Floripa Sat e do Serpens, membros da equipe já participaram de outras missões aeroespaciais. Em 2006, quando ainda era estudante de mestrado da UFSC, o professor Kleber teve participação na missão do astronauta brasileiro Marcos Pontes, como responsável por um dos experimentos utilizado pelo astronauta no ambiente de microgravidade da Estação Espacial Internacional. O doutorando Leonardo Slongo participou, junto com Kleber, de projetos do Programa Microgravidade da AEB e acompanhou, no Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão, o lançamento de foguetes que executaram diferentes experimentos. O professor Eduardo Bezerra atua há mais de dez anos no projeto e desenvolvimento de sistemas computacionais embarcados para os satélites de grande porte do Programa Espacial Brasileiro.