Mudança de Hábito

11/12/2015 09:07

Tese propõe atividades para estimular uso de bicicleta

Camila Geraldo

Joinville foi conhecida como “a cidade das bicicletas”, por causa de seus muitos operários e poucos morros. No entanto, após os anos 1970, trabalhadores que costumavam pedalar até as empresas trocaram o antigo hábito por automóveis e motocicletas – situação comum nas cidades brasileiras. Essa foi uma das motivações que levou a pesquisadora Ilca Maria Saldanha Diniz, em tese defendida no Programa de Pós- Graduação em Educação Física (PPGEF) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a analisar os efeitos que atividades educativas, como palestras e vídeos, podem causar ao incentivar os funcionários de uma indústria a ir ao trabalho de bicicleta.

A pesquisa, orientada pela professora Maria de Fátima da Silva Duarte, observou, durante seis meses, os meios de deslocamento de 932 funcionários de uma indústria metal-mecânica de Joinville. Foram elaboradas atividades que consistiam em aulas informativas e práticas, apresentações em vídeo, palestras, jogos e leitura de cartilhas de segurança – tudo elaborado a partir das necessidades do trabalhador. As temáticas expostas aos industriários foram a relação do uso da bicicleta com o meio ambiente, saúde, itens de segurança necessários e leis de trânsito.

Para descobrir os efeitos, a pesquisadora montou um Grupo Intervenção (GI) e um Grupo Controle (GC), que, após perdas amostrais no final do estudo, contavam com 876 trabalhadores, 438 em cada. O resultado do estudo foi o aumento de 2,2% no número de funcionários do GI que passaram a se deslocar de bicicleta. “Nós não tínhamos ideia de quanto aumentaria ou se teriam alguma resposta às atividades. Em pesquisas, o máximo de mudanças que vimos em programas no Brasil e no exterior, por meio de educação, foi de 3% de aumento nos fins desejados. Deu muito certo, um resultado positivo”, diz Ilca. A pesquisadora também considerou que, pelas interações terem sido realizadas por somente seis meses esses efeitos foram surpreendentes.

Em outros programas de incentivo ao uso da bicicleta, as atividades educativas foram desenvolvidas por um maior período de tempo, entre 12 e 18 meses.

No estudo, os trabalhadores foram divididos em os que usavam e os que não usavam bicicleta para se deslocar até a indústria. A metodologia empregada consistiu em formar grupos de pessoas com interesses e hábitos semelhantes e desenvolver atividades específicas a cada. A partir disso, em 23 encontros, foram aplicados questionários para compreender as características dos trabalhadores e estimular a forma de transporte. “No processo, as pessoas foram classificadas em estágios, que dependem do hábito que o funcionário tem de pedalar, pois as informações que precisamos dar para que a pessoa mude de comportamento depende da experiência de cada um”, explica Ilca.

De acordo com a pesquisa, é necessário melhorar todo o processo educativo no Brasil em relação à bicicleta, considerando-se o município em que a atividade está sendo aplicada e as pessoas para quem são destinadas as aulas, principalmente nas escolas e ambientes de trabalho. Na realidade daqueles industriários, foi verificado que as maiores barreiras para escolher o meio de transporte eram o trânsito intenso, a distância percorrida para chegar ao destino e o clima desfavorável. Também foram listados os principais motivos para escolher a bicicleta: melhora da saúde, prática de exercícios físicos e proteção ao meio ambiente.

Pelos questionários respondidos, foi possível descobrir que a maioria dos trabalhadores relatou ter ensino médio completo ou curso técnico, com renda familiar entre R$ 1.080 e R$ 2.700. Algumas características predominavam nos trabalhadores que mais pedalavam até a indústria: menor renda, residência à distância menor ou igual a cinco quilômetros, menor escolaridade e posse de bicicleta – cerca de 72% a tinham.

Na opinião da pesquisadora, o que mais influencia o uso da bicicleta é a ciclovia. “Em torno da indústria que estudamos, havia ciclovia em todos os pontos: ciclovia mesmo, não somente uma faixa pintada onde se diz que pode passar a bicicleta. Hoje, as maiores cidades catarinenses ou não têm ciclovias ou, quando têm, elas são interrompidas em alguns pontos e não garantem segurança. Temos que criar a cultura da infraestrutura ciclística e do respeito ao ciclista”, completa.

Um estudo realizado pelo Sesi em 2009 apontou que, no estado de Santa Catarina, a prevalência do uso da bicicleta no deslocamento ao trabalho é em Joinville, com 12,8%. As outras duas cidades catarinenses com maior número de pessoas que costumam pedalar até o trabalho são Lages (12,3%) e Blumenau (7,5%). Muitas das informações contidas na tese serviram de subsídio à formulação de um manual para indústrias do Senai/ Sesi, que está sendo distribuído em todo Brasil.